Apr 23, 2020

Algum dia da pandemia. Ou o pior roteiro de filme da sessão da tarde de todos os tempos

Parece que eu só volto por aqui em momento de crise. Quando criei o blog não era assim, mas acho que agora é isso mesmo... 

Estamos aqui em abril de 2020, isolados em casa, em meio à pandemia de Covid-19. 
Na presidência do Brasil está o tal capitão contra o qual marchamos em 2018 (última vez que escrevi no blog). A situação é muito triste.
Às vezes oscilo entre tristeza e raiva, um pouco de melancolia e depois fico esperançosa, aliviada em alguns momentos. Mas a situação está difícil.

Na TV, entre os absurdos que são noticiados todos os dias, acho muito difícil entender que algo carinhosamente apelidado de Gabinete do Ódio ainda não tenha sido desintegrado.
Um grupo com poder de decisão sobre a vida e a morte (ou sobre matérias legislativas que podem auxiliar ou dificultar a vida da população) não pode ser chamado (com razão) de Gabinete do Ódio e continuar existindo.
Meu problema não é com o apelido dado, entendam, é com o fato de que o apelido cabe, o apelido foi assumido por eles, eles se reconhecem nele.
Não pode! Não é aceitável!

Ah, mas vai dizer que você não sente um odiozinho de vez em quando?
Claro que sinto, especialmente quando vejo umas coisas dessas, mas é inadmissível que o ódio ao outro seja institucionalizado, reconhecido e aceito. Que tenha um gabinete e que alguém te aponte o caminho.
É de cair o cu da bunda!
Ah, e claro, Gabinete do Ódio é o gabinete do filho do presidente.

Por sinal, acho surreal essa história de filho do presidente... sabe tipo monarquia, família real de filme B, que prepara os herdeiros, que eles tem que acompanhar algumas reuniões para depois assumir o cargo? Mas não estamos numa monarquia, e se estivéssemos, essa não seria a "família real"... é golpe ditatorial mesmo... o filho do chefe cuida das contas das mídias sociais. Não é uma assessoria de imprensa, é o zero qualquer coisa. S-U-R-R-E-A-L!

Neste exato momento estamos aqui vendo o mundo todo lutando pela vida da população, correndo com medidas econômicas de auxílio aos mais vulneráveis. Cidades, estados, países fechados há meses. Centenas de milhares de mortos no mundo todo. E na maioria dos lugares a epidemia está ascendente, está crescendo, inclusive por aqui.
O Brasil vai na contramão das medidas sanitárias. 
O presidente briga com os governadores, discorda do ministro da saúde (a quem ele demite no meio do furacão), discorda da OMS, dos médicos e pesquisadores da área de saúde.
Uma meia dúzia de semi-endinheirados sai às ruas com seus carros tamanho GG pedindo a abertura do comércio além dos serviços essenciais. Gritam que as pessoas pobres morrerão de fome.
Mas não gritam com a mesma força para pedir que as medidas de auxílio econômico aos mais vulneráveis sejam maiores e a distribuição mais eficiente.
Querem que as pessoas voltem ao trabalho, porque sem a autorização dos estados e municípios não podem chamar seus empregados domésticos de volta, não podem voltar ao seu consumo diário de itens supérfluos. 
Não existe preocupação com a economia. Existe é preocupação com a manutenção do próprio privilégio, mas não vamos admitir isso nunca, porque é feio. Então diremos que é para a economia não entrar em colapso.

Ô anjos, não tem mais jeito, a economia mundial entrará em colapso, não é mais possível reverter. O que dá pra diminuir um pouco é o número de mortes.

Acho ruim falar número de mortos, é muito impessoal. Parece que quem morreu não era gente, não era da família de alguém, não era mãe, pai, vô, vó, tio, tia, filho, filha, BFF, ou o grande amor da vida. 
É bem mais triste pensar assim, mas é mais real.
Escrevo agora com aquele nó na garganta que a gente sente ao segurar o choro.
Números não impressionam. Gráficos não causam dor se não se souber lê-los.
E hoje a notícia é de que além do sistema de saúde chegar no seu limite, da falta de equipamentos de proteção para os profissionais da saúde, também os serviços funerários chegaram ao limite. Não dá mais para abrir valas individualmente e os enterros serão coletivos. Tem fila nos cemitérios, mas não tem velório.
Em Manaus o número de mortos em um dia é 3 vezes maior do que se morria normalmente. Na conta do jornalista, se o número de mortes no trânsito e os assassinatos diminuíram com o isolamento social, então, o número de mortos infectados pelo vírus é mais do que 2 vezes o número médio diário de mortos na cidade. Mas não temos testes suficientes para comprovar esse volume. A subnotificação é enorme.
Não temos informação, só podemos ler os dados e desconfiar um pouco.

Aí, como se não bastasse a loucura geral em que nos encontramos, o presidente comprou briga também com o ministro da justiça, aquele marreco golpista que era juiz e virou "superministro". O noticiário do meio da tarde parece noticiário dos alunos da 2ª série na cobertura do cabo de guerra da hora do recreio.
Não creio!

Em tempo, só pra deixar registrado, não há da minha parte apoio a nenhum ministro deste governo. Nenhum, em momento algum. Mas, contudo, todavia, entretanto,  é bem imprudente demitir um ministro de saúde que minimamente sabia o que estava fazendo, pra colocar outro no lugar no meio de uma crise sanitária de níveis apocalípticos. 

Fico imaginando o presidente felizão da vida pensando como a pandemia veio a calhar em sua necropolítica. Tudo em seu governo apontava para a destruição do estado de bem estar social, dos sistemas públicos de saúde, educação, previdência, distribuição de renda... Aí vem um vírus com a capacidade de eliminar 10% da população. Não pode barrar o vírus. Ele faz parte da solução desse governo: deixar morrer os mais vulneráveis.
Mas... isso é muito cruel! Como você pode pensar isso?
Porque antes era cruel também, mas era mais lento e a gente conseguia fazer de conta que não viu...